segunda-feira, 15 de outubro de 2007

A Graça da Vida

A americana Trish Vradenburgh, que sempre trabalhou com discursos políticos e roteirizou seriados de televisão, resolveu aventurar-se no teatro escrevendo essa peça, dizem, a fim de superar a perda da mãe, tendo novamente a oportunidade de vê-la viva, ali na sua frente, através da interpretação de uma grande atriz.A Graça da Vida é, basicamente, uma história de amor entre pais e filhos, em cujo desenrolar vários temas são abordados com uma leveza impressionante.
Trata-se de uma encenação gostosa de ser assistida, com um texto delicioso de ser ouvido e, acredito, de ser dito. Tudo muito simples, mas que me deixou uma sensação boa, embora reconhecíveis vários furos, a irregularidade do elenco e a incongruente reviravolta no final. No entanto, todos esses aspectos negativos não tiram a sensação de ver grandes interpretações em cena.
De um lado está Kate, uma escritora de sucesso de seriados para TV, louca por trabalho, que praticamente só pensa nisso e mantém uma vida amorosa complicada. Do outro, Grace, uma mãe dominadora que chega sempre em horas indesejáveis. As duas mantêm uma relação conflituosa, que vai da intolerância ao carinho, sempre com muito humor. É calcado na relação mãe e filha que o texto, e a peça, atingem o seu melhor, nos embates freqüentes das personagens e no acerto de contas que, indiscutivelmente, gera grandes interpretações. Kate sabe que precisa dar mais atenção à sua mãe, mas só cai na real quando Grace se descobre com mal de Alzheimer. A partir desse momento, o da deterioração da mãe, é que a filha muda completamente seu jeito de agir.

Num primeiro momento, questionei o porquê da peça ser dividida em dois atos, mas, depois, constatei que , na verdade, há uma peça no primeiro ato, e outra depois. Se, no primeiro, temos um belo texto, emoldurado por um igualmente belo embate de atrizes, no outro ocorre uma reviravolta absurda, que quase consegue fazer com que a peça vire uma piada, uma vez que, em se tratando de uma obra realista e atual, A Graça da Vida não poderia usar de realismo fantástico, imaginação extraordinária ou coisa que o valha.

Em torno das duas figuras centrais da peça, existem outros personagens que fazem parte de suas vidas, personagens esses que, com a exceção do pai, poderiam ser apenas citados. A estrela do seriado que Kate escreve e um funcionário da TV, por exemplo, são totalmente desnecessários, ainda mais com a interpretação caricata de Fábio Azevedo e o trabalho de Clara Carvalho, que não diz a que veio. Eliana Rocha grita em cena para fazer sua Lorna cômica, mas só consegue enganar os mais desavisados; Ênio Gonçalves, na pele do pai, é o maior canastrão de todos os tempos, não conseguindo segurar em nenhum momento o personagem, e, por fim, o único que se salva desta parte do elenco, é o sempre talentoso Emilio Orciollo Netto, que vive o médico de Grace de forma dura quando tem que falar da doença da mãe e com docilidade quando se apaixona pela protagonista Kate.

No elenco principal, Graziella Moretto é uma grata surpresa. Avalizada por grandes produções como Avenida Dropsie e Beijo no Asfalto, a atriz é mais conhecida do grande público pela sua inegável veia cômica, mas aqui nos mostra que é uma intérprete completa, e de mão cheia, conseguindo cumprir com perfeição a tarefa de encarar, de igual para igual, a maravilhosa Nathalia Timberg sem, em nenhum momento, escorregar. Mantém um bate-bola fantástico, e enfatiza ao espectador a delícia que é assistir a duas atrizes desse porte. E Nathalia é perfeita, desde quando entra em cena, com uma vivaz Grace, até quando acaba em uma cadeira de rodas, passando, momento a momento, as sutilezas da deterioração que a doença causa nas pessoas. E tudo isso só não é melhor por causa do ritmo frenético da ação, com muitos cortes que deixa a apresentação muito televisiva, provavelmente por conta do trabalho da autora.

Não se pode deixar, ainda, de ressaltar a maravilha do figurino usado pelas protagonistas, tudo de muito bom gosto: Graziela desfila vários modelos em cena, cada um mais lindo que o outro, trabalho brilhante da figurinista Giovanna Moretto. Cenário, iluminação e trilha sonora sem grandes destaques, mas tudo bem feito.

A Graça da Vida vale, basicamente, pela dupla Timberg-Moretto. Portanto, se você não gosta de nenhuma das duas, não há motivo para assistir; mas, se você quer ver um belo embate de duas atrizes em plena execução de seu ofício, vá fundo. Nathalia Timberg e Graziella Moretto são literalmente a graça da peça.

Cotação: Bom (***)

Serviço: A Graça da Vida
De: Trish Vradenburgh
Adaptação: Paulo Autran
Direção: Aimar Labaki
Com: Nathalia Timberg, Graziella Moretto, Ênio Gonçalves, Eliana Rocha, Clara Carvalho, Fábio Azevedo e Emílio Orciollo Netto

A Festa de Abigaiu

Vencedora do 10º Festival da Cultura Inglesa, na categoria teatro adulto, A Festa de Abigaiu é uma deliciosa comédia, com texto do inglês Mike Leigh (diretor de filmes como SEGREDOS E MENTIRAS e VERA DRAKE), que tem, pela primeira vez, um trabalho seu montado por aqui, e vem ganhando a platéia paulistana.Escrita em 1970, a peça enfoca o realismo social, ou seja, o dia a dia, os problemas, as frustrações e desejos, de cinco personagens que se encontram com o pretexto de conversar e se divertir.

A partir daí, feridas são expostas, assim como hábitos politicamente incorretos e reações muitas vezes exageradas – diante dos outros e de uma platéia atenta. Recheada de humor negro, a obra diverte e nos faz rir de forma inteligente, sem apelar, em momento algum, para palavrões ou técnicas mais fáceis, tão comumente usadas para ganhar o público. Aliás, muitas vezes, é uma pausa, ou um silêncio, que fazem com que a platéia desande a rir.

Leigh nos introduz no cotidiano e nos costumes de um grupo de losers, que vivem em um condomínio onde está acontecendo a tal festa do título, num verdadeiro jogo de poder, uma competição para mostrar, a todo momento, quem é o melhor.

A direção da montagem brasileira é de Mauro Baptista Vedia, que usa de pausas e marcas muito bem colocadas, pois o próprio autor explica que cada personagem tem um tom exigido, o que se nota claramente na adaptação. A anfitriã Beverly, que vai para o lado da comédia e do cinismo, é interpretada pela fantástica Ester Laccava, que mais uma vez arrebenta em cena, principalmente se considerarmos que a intérprete vem de um gênero completamente diferente em seu trabalho anterior. Com uma personagem que está sempre preocupada com seus convidados, e sempre tentando se mostrar melhor, a atriz usa esse humor cínico com perfeição.
Eduardo Estrela, diz o diretor, seria o elo mais dramático, na pele de Lawrence, o marido e dono da casa, preocupado com o trabalho e sempre confrontado por sua mulher.

Com uma interpretação recheada de silêncios e expressões, Estrela mostra-se, também, o elo mais fraco do elenco. Ângela, vivida por Ana Andreatta, já nos ganha quando diz a primeira sílaba. Uma personagem caricatural, com o lado infantil muito aguçado, que é constantemente humilhada pelo marido mas, ao mesmo tempo, consegue ser doce e gentil. Em suma, pode até se tratar de uma caricatura, sim, mas feita com maestria. Fernanda Couto é Susan, a vizinha mais intelectual, sofisticada e de fala mansa, interpretada com enorme talento pela atriz, que faz dos gestos e expressões a base da sua composição. Por fim, o bonachão Tony, defendido por Marcos Cesana, faz um tipo grosseiro e cansado de tudo a sua volta, recado que o ator dá conta sem muitas exigências.

Enfim, um elenco afinado, texto inteligente e boa direção, que estão cercados de outro bom grupo: o cenário, de uma casa classe média britânica, cheia de detalhes e objetos de cena, tudo muito útil à encenação, leva a assinatura de Álvaro Razuk; a trilha original, fantástica, quase como um sexto personagem, foi criada pelo próprio autor, e adaptada pelo diretor, e o figurino, bonito e de acordo com a época, feito por Maite Chasseraux.

Tantas qualidade fazem de A Festa de Abigaiu a zebra das peças da cidade, pois, chegando de cantinho, vem conquistando as platéias e já é considerada a terceira melhor peça em cartaz na capital paulista, segundo revista especializada. Texto inteligente para pessoas de bom gosto. O último por favor apague a luz!

Cotação: Muito Bom (****)

Serviço: A Festa de Abigaiu
De: Mile Leigh
Direção: Mauro Baptista Vedia
Com: Ester Laccava, Ana Andreatta, Eduardo Estrela, Fernanda Couto e Marcos Cesana

O Método Grönholm

Texto do espanhol Jordi Galcerán, O método Gronholm ganhou diversos prêmios na Espanha e também já pode ser visto nas telas de cinema com o título O que você faria? Com temática bastante atual a história conta a dificuldade pela busca de um bom emprego e o que as pessoas fazem para consegui-lo.

Quatro grandes executivos se reúnem em uma sala fechada para conseguir um grande emprego em uma multinacional, recheado de humor, sarcasmo e ironia os quatro se submetem a coisas inimagináveis, diante disso tudo existe um detalhe muito importante, entre eles existe um executivo da empresa disfarçado e que irá escolher quem será o escolhido, o método do título realmente existe e é usado em grandes empresas mundo afora.O mistério de saber quem é o elemento infiltrado instiga o público até o final, e por razões óbvias aqui não será revelado.


O texto pode ser direcionado tanto para o drama quanto para comédia, na encenação brasileira a comédia dá o tom do espetáculo, um texto contemporâneo e inteligente, uma boa direção e um grande exercício para os atores, que enfrentam uma dupla jornada, interpretam os executivos e também situações impostas pela empresa.Um cenário clean e sofisticado de Marcos Flaskman, e um figurino sóbrio e elegante de Paula Raia e Fernanda de Goeye, aliadas a correta iluminação e trilha sonora dão um cara bonita ao espetáculo. O grupo de quatro atores é bastante entrosado o que faz o resultado ser ainda melhor. Lázaro Ramos e Ângelo Paes Leme são os astros do espetáculo, o primeiro é Fernando Fontes um executivo perspicaz e engajado pela empresa, o ator está fantástico principalmente nas cenas cômicas, fazendo valer com louvor o burburinho em sua volta atualmente, o segundo é Carlos Figueiredo competitivo ao extremo e digamos um pouco delicado, ou estaria ele fingindo ser o que não é? Em o método é assim, nada do que parece é, Ângelo relegado a papéis secundários na tv aqui arrasa com seu timming cômico, Edmílson Barros vive Henrique Madeira sujeito atrapalhado (ou não) que já ganha a platéia com gagues e trejeitos, bastante talentoso mas infelizmente faz rir de forma mais fácil usando desses artifícios, ao contrário dos outros dois, Taís Araújo é Mercedes Delgado sem dúvida o elo mais fraco do elenco, com uma pose de executiva extremamente artificial a atriz escorrega por alguns momentos mas não prejudica em nada por que no conjunto os quatro são muito afinados, e isso fica muito claro na cena em que eles usam cada um, um chapéu diferente, eles arrasam e se divertem muito em cena.


No todo a peça é boa, e o grande mérito é um texto extremamente atual e um elenco entrosado, cortando alguns excessos a peça ficaria redonda. O método Gronholm nada mais é que um jogo, em que participam atores e platéia e acredito eu um jogo que merece ser jogado.


Cotação: Bom (***)

Serviço: O Método Gronholm
Texto: Jordi Galcerán
Direção: Luís Antônio Pillar
Com: Lázaro Ramos, Taís Araújo, Ângelo Paes Leme e Edmílson Barros
Onde: Teatro das Artes-SP
Temporada até 16 de dezembro

domingo, 12 de agosto de 2007

Garota Glamour

O ano é o de 1969, a televisão em cores começa a chegar ao Brasil e a TV Tupi era a emissora do momento. O concursos de beleza pipocam como verdadeiros eventos, trazendo meninas que devem usar sua belezae talentos de canto, dança e interpretação, para ganhar o público. “Garota Glamour” é mais um desses concursos, e também é a peça escrita e dirigida por Wolf Maya para inaugurar o teatro Nair Bello, em São Paulo.
Seguindo a onda que assola a cidade, a peça é um musical, ainda que mais tímido e sem as cifras milionárias das outras montagens do gênero, cifras essas que não são garantia de qualidade. A história se passa toda em um programa de auditório, e a platéia faz parte do tal concurso, que é apresentado por Bellafonte. Sem um texto mais forte, a trama é costurada pelas histórias de algumas candidatas e por números musicais em excesso, de onde saem algumas historinhas e números bastante divertidos e outras bem fracas e cansativas.

O cenário da rede de televisão e os figurinos são muito bonitos e caprichados. Mas se as coreografias são muito boas, a escolha de repertório tem alguns erros graves. Por ter um clima todo saudosista, o espetáculo conquista a platéia, principalmente os mais velhos. É divertido, sim, mas também fútil e raso. No entanto, se o intuito é só divertir, a tarefa é cumprida. O elenco é praticamente uma montanha russa, cheia de altos e baixos: alguns cantam bem e atuam mal, outros atuam bem e cantam mal, e outros fazem tudo bem ou tudo mal. Totia Meirelles, que interpreta a mãe de uma das candidatas, é uma estrela nata, ao estilo Claúdia Raia. A atriz canta, dança e atua muito bem como a mãe de miss, eleva os espectadores ao delírio. Se tivesse surgido em outros tempos, Totia tinha tudo para se tornar uma estrela, mas sabemos como são as coisas... Renato Rabelo, um ator fraco, aqui tem seu melhor desempenho nos palcos, pois, apesar de totalmente over, o ator encarna bem o apresentador fresco, ganhando a platéia. Ainda do enorme elenco, são poucos os que merecem ser citados: Paola Crosara é deliciosa, e só sua imagem já vale mais que qualquer dança, atuação ou o que seja; Aime Bocchi, Andreya Vieira e Tatiana Cruz cantam muito bem; as gêmeas Bruna Guerim e Karin Roepke também merecem destaque, além, é claro, de Felipe Galganni, que faz a bichinha mais divertida de todos os tempos.
A peça tem cara de caça níqueis, mas sabe que não é? É bem feitinha e tem algumas coisas boas. Não fosse o excesso de números sem valia e seu elenco tão desproporcional, sairia coisa melhor. E um detalhe interessante é que nós, o público, votamos e escolhemos quais candidatas queremos nos três primeiros lugares. Se estiver dando uma passeada pelo shopping, e não tiver nada melhor para fazer, entre e confira.
Cotação: Regular(**)
Serviço: Garota Glamour
Texto e direção: Wolf Maya
Com: Totia Meirelles, Renato Rabello, Luiz Araújo, Paola Crosara, Aime Bocchi, Tatiana Cruz, Andreya Vieira, Felipe Galganni, Bruna Guerim, Karin Roepke e grande elenco
Onde: Teatro Nair Bello
Temporada até novembro.

terça-feira, 7 de agosto de 2007

No Retrovisor

Podemos dizer que “No Retrovisor” é um espetáculo recheado com tudo aquilo que uma boa peça deve ter: excelente texto, boa e sensível direção, uma dupla de atores de primeira grandeza, uma trilha musical fantástica e cenário, figurinos e iluminação que se encaixam de forma perfeita no todo. Além de tudo isso, o espetáculo é pop e moderno. Marcelo Rubens Paiva, autor do brilhante “Feliz Ano Velho”, faz desse texto um de seus melhores trabalhos, mesclando sentimentos diversos, tais como traição, medo, incerteza, dúvida e, principalmente, uma bela, e nada convencional, amizade.

A trama começa quando a dupla de atores, de teatro de improviso, faz da platéia do teatro uma festa. Já fazendo parte da peça, os atores que, na verdade, já estão encarnando os personagens Marcos e Ney, cantam e levam os espectadores às gargalhadas. A partir daí, aluz se apaga, o pano sobe, e vemos um cenário de um apartamento sujo e bagunçado, mas cheio de elementos de cena. Marcos, que leva uma vida medíocre e pobre, com um filho e uma esposa, recebe a visita de Ney, que virou um cantor brega de grande sucesso, mas que ficou cego devido a um acidente que mudou para sempre o rumo da vida desses dois jovens sonhadores, apaixonados por teatro, que desejavam brilhar juntos, mas que, diante de tal fatalidade, tiveram que caminhar para lados opostos.Esse encontro acaba se tornando um acerto de contas cheio de revelações doloridas e recheado por um humor ácido comum ao autor.

A conversa dos dois é pontuada por diversas citações pop que fizeram parte da juventude dos personagens. Estão lá principalmente ícones de nossa cultura como Cazuza, Renato Russo, New Order, The Clash e o grupo de teatro Asdrúbal Trouxe o Trombone. Os dois protagonistas brincam em cima disso, citam vários nomes conhecidos do grande público e debocham de muita coisa do meio cultural atual, tudo em um ritmo frenético, que mexe com a platéia a todo o momento, surpreendendo e até causando certa estranheza.A direção de Mauro Mendonça Filho é saudosista, além de bastante sensível e competente, cercando a montagem de um conjunto que dá muito certo. Já a dupla de atores é um deleite à parte. Depois de cinco anos atuando juntos neste espetáculo, os atores já se encontram em grande afinação, o que facilita muito o jogo de cena. Mas, além de tudo isso, temos no palco dois atores de uma grandeza ímpar.

Otávio Muller e Marcelo Serrado estão deslumbrantes em cena: ácidos, debochados, divertidos, emocionados e, sobretudo, competentes. Ora um cede espaço para o outro brilhar, e vice versa. Serrado consegue ser cômico, incorporando muito bem a cegueira ao personagem, mas também visceral quando fala do acidente, ganhando a platéia no momento em que conta o que poderia ter sido a vida de ator dos dois amigos, se não tivesse ocorrido a fatalidade. Muller é um absurdo de bom, e na cena em que ele pega o microfone e relembra o que eles eram, o ator faz a platéia arrepiar e delirar. Ele literalmente se entrega – se jogando, dançando, pulando, gritando e cantando – e brilha junto com o companheiro na cena em que destroem o cenário inteiro numa alusão do que teria acontecido em suas vidas.

Não à toa, “No Retrovisor” está em cartaz há cinco anos, e em breve vai virar filme. Não deveria sair nunca de cartaz, proibindo-se que outra dupla de atores o fizesse. A reunião de Rubens Paiva, Serrado, Muller e Mauro Mendonça Filho virou uma comunhão e fez desse espetáculo uma das coisas mais deliciosas e inteligentes de se ver nos últimos tempos.


Cotação: Excelente (*****)
Serviço: No Retrovisor
De: Marcelo Rubens Paiva
Direção: Mauro Mendonça Filho
Com: Otávio Muller e Marcelo Serrado
Onde: Centro Cultural São Paulo - Sala Jardel Filho
Temporada até 12 de agosto.

domingo, 5 de agosto de 2007

Pequenos Crimes Conjugais

Eric-Emmanuel Schmitt é um dos autores mais lidos e encenados internacionalmente da última década, e uma de suas peças, “Pequenos Crimes Conjugais”, ganha sua primeira encenação no Brasil. Nem o próprio autor consegue dizer exatamente qual é o gênero do texto, e isto vai muito da percepção de cada um. Eu diria que é uma mistura de drama, romance e suspense, o que torna o título “Pequenos Crimes Conjugais” fantástico e incrivelmente apropriado.

Lisa e Gilberto são, aparentemente, um casal feliz, bonito e sem problemas. De repente, um acidente causa amnésia em Gilberto, e, a partir daí, Lisa passa a querer moldá-lo da forma que gostaria. Quando o rapaz volta para casa, um clima de total desconfiança começa a rondar a dupla nessa tentativa de recriar a vida a dois. O texto é brilhante, agudo e contundente, com diálogos ferinos e outras vezes doces. Os protagonistas ora se mostram como inimigos, ora como casal, e, a partir daí, várias reviravoltas acontecem, mesclando-se a união de fatos do passado, que se revelam em perspectivas para o futuro, e divagações sobre fidelidade e individualidade. A trama é perspicaz e envolvente momento a momento, muitas vezes nos tornando cúmplices dessa impecável tradução de Paulo Autran e eficaz direção de Márcio Aurélio, as quais contribuem para o bom resultado do espetáculo. O cenário de Isay Weinfeld é um luxo só, aqui indescritível, e, aliado à iluminação, cria um clima frio e de mistério apropriados para o desenrolar da trama. Os figurinos são da grife Armani, e, por fim, a trilha sonora vem arrematar esse belo conjunto técnico.

Já quanto ao elenco, a montagem era inicialmente prevista para ser feita com Marília Gabriela e Edson Celulari, mas, por diversas circunstâncias, foi parar nas mãos de Maria Fernanda Cândido e Petrônio Gontijo. Petrônio é pura doação, sentimento que surte efeito na impecável composição do ator, que sai de um morno desempenho na comédia “Acorda Brasil” para brilhar em “Pequenos Crimes...”. Ele faz um Gilberto frio, calculista, doce e amoroso, e essas diversas nuances são dominadas com maestria pelo intérprete. No entanto, tudo não resulta em melhor resultado porque o ator acaba sendo barrado na troca com sua colega de cena. Não que a bela Maria Fernanda Cândido esteja mal... longe disso. A atriz é esforçada, mas crua demais, e não tem “cancha” para brilhar em texto de tamanha complexidade. Ela não se sai muito bem nas trocas de nuances e, principalmente, não convence nos momentos de desespero. Em compensação, quando exigida nos quesitos sensualidade e doçura, o resultado é um pouco melhor. Acredito até que, daqui a algum tempo, ela seja a atriz ideal para esse papel. Mesmo assim, não dá para negar que existe nítido esmero por parte da intérprete, embora fique imaginando que essa personagem, nas mãos de uma grande atriz, seria um prato cheio e um jogo perfeito entre as duas partes.

Voltando a salientar a excelência do texto, assinalo que este espetáculo vale ser visto por se tratar de entretenimento inteligente, que valoriza e respeita o espectador. Grande texto em mãos erradas.

Cotação: Bom (***)
Serviço: Pequenos Crimes Conjugais
De: Eric-Emmanuel Schmitt
Tradução e Adaptação: Paulo Autran
Direção: Márcio Aurélio
Com: Petrônio Gontijo e Maria Fernanda Cândido
Onde: Theatro São Pedro, Porto Alegre
Dias 24, 25 e 26 de agosto/2007.

Toalete

Tendo como referência o nome do dramaturgo Walcyr Carrasco, um dos atuais queridinhos da Rede Globo, e de quem leio as ótimas crônicas quinzenais na Revista Veja-SP, resolvi encarar uma comédia que já prometia, em sua chamada, que o espectador iria “fazer xixi” de tanto rir. Já é bastante difícil me fazer rir, e, quando é para rir de coisa ruim, pior ainda.

No caso, como a promessa não se cumpre, pode-se dizer que se trata de propaganda enganosa e o autor, pela segunda vez no teatro, me decepciona. Se na fraca “Até que o sexo nos separe”, Walcyr brincava com os estereótipos do casamento, nessa "Toalete" ele chega muito perto do grotesco. O texto, que até parte de um ponto inicial interessante - principalmente para o universo masculino, que tem intensa curiosidade para saber o que se passa emum banheiro feminino -, carece de um fio condutor, uma vez que a história que norteia tudo é, basicamente, uma colagem de textos, no pior estilo "Zorra Total", com abundância de estereótipos, piadas preconceituosas e muitos palavrões, que, no entanto, até podem divertir uma platéia menos acostumada com o bom teatro.

Todos os clichês estão lá: loira burra, lésbicas, o homossexual afetado, a evangélica, prostitutas, apresentando-se em esquetes por vezes constrangedoras. Para não dizermos que tudo é horrível, o cenário, um banheiro feminino de um hotel de luxo, é muito bonito, mas acho que os elogios param por aí. Já no elenco, uma boa atuação se destaca: Vera Mancini acaba se dando bem com o que lhe é oferecido, provando que, às vezes, um texto ruim não chega a derrubar uma grande atriz. Márcia Cabrita é cômica, mas repete aquilo tudo que já a vimos fazer várias vezes. O resto do elenco passa do ruim ao sofrível: Suzana Pires, Flávia Garrafa, Cynthia Falabella, Antoniela Do Canto, Stella Maria Rodrigues e Renato Wiemer devem ocultar esse trabalho de seus currículos.

É muito triste que a comédia, um dos gêneros mais difíceis de ser feito, tenha se reduzido a um monte de clichês e palavras de baixo calão, deixando de lado, na maioria das vezes, um humor mais ácido e, principalmente, mais pensante. Mas a culpa não é só de quem faz, e sim de uma platéia pagante que lota esses espetáculos e se contenta com tão pouco.

Cotação: Ruim (*)
Serviço: Toalete
De: Walcyr Carrasco
Direção: Cininha De Paula
Com: Vera Mancini, Márcia Cabrita, Stella Maria Rodrigues, Suzana Pires, Renato Wiemer, Flávia Garrafa, Cyntia Falabella, Antoniela Do Canto
Onde: Teatro Gazeta-SP
Temporada até 2 de Setembro